sexta-feira, 21 de maio de 2010

Responsabilidade em projetar edifícios dignos

Com mais de três décadas de profissão, o arquiteto Sérgio Roberto Parada tem em seu currículo diversos prêmios e homenagens, consequência das inúmeras obras projetadas nas mais diversas tipologias, que vão de edifícios comerciais a terminais de passageiros. Dentre as obras mais recentes de sua autoria, e que provam sua versatilidade profissional, estão a cobertura da piscina semiolímpica do Iate Clube de Brasília, a sede do Iphan, ambos em Brasília, e o Aeroporto Internacional de Wuxi Shuofang, na China. Curitibano de nascimento e brasiliense de coração desde 1997, quando montou seu escritório na capital federal, Parada fala nesta entrevista de seu processo de criação e da construção do Aeroporto Internacional de Brasília, que tem gerado polêmica entre profissionais do setor.
O sr. disse que no momento de reflexão sobre o desenho do edifício procura aprimorar a qualidade espacial, o respeito ao espaço público, a melhor tecnologia e sempre buscando minimizar o consumo de energia. Como estes conceitos se aplicam ao projeto do aeroporto de Brasília?
Sérgio Parada - Se aplicam integralmente. Desde os primeiros esboços que elaborei, baseado no programa estabelecido pela Infraero e apesar das restrições que tinha pela frente, como o terminal existente que deveria continuar operando enquanto as obras de ampliação fossem se desenvolvendo, tinha em mente a concepção de um edifício que pudesse aproveitar ao máximo aquilo que a natureza nos oferece, como luz e ventilação naturais, além de criar com generosidade a integração do espaço externo com o interno do edifício, criando uma praça coberta onde formasse um ponto de encontro entre pessoas que chegam e que partem. Acho que um edifício, principalmente público, deve sempre pensar na minimização de custos de manutenção, assim como no consumo de energia.
A Infraero decidiu completar o projeto do aeroporto JK, com a construção do Satélite Sul, utilizando um novo modelo. O sr. concorda com esta decisão?SP - Quando li sobre a decisão da Infraero, realmente fiquei preocupado e indignado, pois demonstrava uma visão distorcida sobre a arquitetura do terminal, e publicamente víamos uma total insensibilidade no tratar e entender a arquitetura como um produto de nossa cultura. O terminal de Brasília tem suportado uma demanda muito acima daquela para qual o edifício foi projetado, e mesmo assim tem mantido sua dignidade arquitetônica. Claro que dentro deste panorama de desequilíbrio de área construída e demandas, encontramos alguns problemas, dentre eles o desconforto dos passageiros nas horas de pico, assim como a saturação de espaços para algumas atividades operacionais. No entanto, o terminal tem resistido a isso tudo.
O problema não é da concepção “antiga” e “ineficaz” da arquitetura do terminal, mas sim a falta de planejamento da Infraero, que tinha em mãos todos os dados de crescimento da demanda acima do estabelecido pelo plano diretor e não fez o planejamento adequado e necessário para minimizar os impactos negativos. A Infraero deveria ter concluído totalmente o atual terminal no início desta década, juntamente com as obras realizadas em 2004. Deveria também estar com o projeto do novo terminal, adjacente a este, concluído para licitação da obra. Certamente, se isso tivesse sido considerado, não teríamos de enfrentar esses problemas que hoje detectamos no terminal de passageiros
Como o projeto de reforma, ampliação e modernização otimizou a infraestrutura existente e viabilizou a construção em etapas? O aço foi elemento definidor para agilizar a obra?SP - Este projeto/obra me proporcionou um grande aprendizado, e acredito que para toda a equipe técnica. Naquela época, tínhamos uma vontade de realizar um trabalho e qualidade de obra muito grandes. Éramos todos muito unidos pelo mesmo objetivo e este foi um dos grandes segredos deste trabalho tão complexo se tornar realidade. Hoje, quando vemos a obra parcialmente pronta, não imaginamos a complexidade em se resolver um projeto de um terminal de passageiros praticamente sendo construído sobre outro existente, com todas as interferências operacionais e construtivas. Foi um trabalho feito por muitas mãos que resultou no desenho de um edifício que eu defendia e que trazia um resgate de uma ideia para Brasília.
Tínhamos que tomar por base que o aproveitamento máximo da infraestrutura existente era fundamental, principalmente na questão de pátio de aeronaves, construção muito cara. Depois, o edifício sofreria uma metamorfose, ou seja, se transformaria num terminal moderno e adequado às necessidades, com pontes de embarque/desembarque, utilização de sistemas de controle do edifício de última geração, enfim, uma aposta na modernização. Para que tudo isso fosse realizado, claro que a tecnologia de construção deveria atender às exigências de segurança, tempo adequado, adaptações de operações etc.
Neste processo, a técnica do uso do aço foi fundamental, da mesma forma que a pré-fabricação do concreto e outras técnicas. O importante disso tudo foi o resultado obtido, que apesar das limitações existentes, o terminal de passageiros mostrou sua dignidade e responsabilidade para com a cidade.
Como é criar um projeto para uma cidade em que existem diversas obras de Niemeyer?SP - Independentemente da maravilhosa obra de Niemeyer, e de outros tantos arquitetos valorosos que contribuíram com a arquitetura de Brasília e do Brasil, acredito que todos nós, arquitetos, devemos ter uma grande responsabilidade que é criar edifícios dignos, que atendam às necessidades programáticas, que levem consigo a marca de sua época, e fundamentalmente o respeito para com o meio natural e artificial onde estão inseridos. Então, dentro destes conceitos, cada arquiteto coloca seu conhecimento e sua responsabilidade quando desenha um edifício. No entanto, para mim, sempre é uma honra fazer qualquer trabalho para essa cidade que amo e considero minha também, e o fato dessas obras conviverem com tantos mestres da arquitetura brasileira, lado a lado, é uma honra.
Em sua opinião, qual sistema construtivo viabilizará as obras de infraestrutura visando a Copa 2014 e os Jogos Olímpicos?SP - O apuro tecnológico do aço será fundamental para viabilizar toda a infraestrutura que o Brasil deverá construir em tão curto espaço de tempo. Já estamos em 2010 e não estamos vendo nada em construção. Como temos percebido ultimamente no mundo, a tecnologia do aço se torna cada vez mais evidente e necessária. Digo evidente porque dificilmente vemos, nos dias de hoje, edifícios que necessitem de grandes vãos ou grandes alturas que não sejam pensados com a técnica do aço. Necessário porque além da tecnologia que atenderá a uma necessidade física, ou melhor, atenderá à estabilidade da edificação, temos o tempo como fator primordial e a possibilidade de um maior emprego do processo de industrialização, diretamente ligada à construção civil.

Foto: divulgação

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